Nº55 - FEVEREIRO DE 2019

Destaque

Socicom acompanha com atenção a política de educação, ciência e tecnologia do novo governo

 

No primeiro mês de governo Bolsonaro, mudanças no comando do MEC e agências de fomento, além de declarações dos ministros da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues, e do MCTI, Marcos Pontes, preocupam membros da diretoria da Socicom. 

 

Em entrevista ao Jornal Valor Econômico em 28 de janeiro, o ministro da Educação disse que estuda a ideia de universidade para todos não existe”. Segundo Vélez Rodrigues, não faz sentido um advogado estudar para virar motorista de Uber. Para o ministro o retorno financeiro dos cursos técnicos é maior e mais imediato do que o da graduação. “As universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual, que não é a mesma elite econômica do país”, afirma o ministro. Por hora, o ministro disse que não está em estudo cobrança de mensalidade nas universidades públicas, mas defende o enxugamento do FIES e o reequilíbrio orçamentário, além de maior investimento no ensino médio.

 

Um levantamento realizado pelo UOL em 24 de janeiro mostra que menos seis militares foram nomeados para cargos no MEC. Além deles, outros dois devem ter as indicações oficializadas em breve por meio de publicação no Diário Oficial da União. São membros das Forças Armadas e até mesmo da reserva remunerada e não remunerada do Corpo de Bombeiros e da Marinha, e irão ocupar cargos no MEC, ficando responsáveis pelo comando de ações como o financiamento estudantil, a regulação do ensino superior presencial e a distância e o gerenciamento de hospitais universitários federais. São eles:

 

1. General Francisco Mamede de Brito Filho, ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) foi nomeado para a chefia do gabinete do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).

2. General Oswaldo de Jesus Ferreira, indicado para Presidência da Ebserh, responsável pelo gerenciamento dos hospitais universitários federais de todo o país. 

3. Coronel Robson Santos da Silva, nomeado assessor especial do ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. 

4. Coronel-aviador Ricardo Wagner Roquetti, nomeado diretor de programa da secretaria-executiva do MEC. 

5. Coronel da reserva remunerada do Corpo de Bombeiros, Luiz Tadeu Vilela Blummnomeado diretor de gestão de fundos e benefícios do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica).   

6. Coronel da reserva remunerada do Exército, Sebastião Vitalino da Silva, indicado para a Coordenação-geral de materiais didáticos da SEB (Secretaria de Educação Básica). 

7. Tenente-coronel Marcos Heleno Guerson de Oliveira Junior, indicado para a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior. 

8. Capitão-de-Corveta da reserva remunerada da Marinha, Eduardo Miranda Freire de Melo, nomeado para a secretaria-executiva do MEC, como secretário adjunto.     

 

 

COMO PENSA A DIRETORIA DA SOCICOM?

 

 

ANA REGINA RÊGO, PRESIDENTE DA SOCICOM

Entre experiências e expectativas, nós da SOCICOM nos colocamos como vigilantes do novo projeto de país que aí se instala, sobretudo, no que concerne às áreas que nos envolvem. Embora seja demasiado cedo para tirar conclusões definitivas sobre uma efetiva política para a educação superior, assim como, para a ciência, tecnologia, inovação e comunicação, visto que nenhum plano maior ou estratégia foi divulgada para além das poucas linhas no reduzido Plano de Governo do atual Presidente, quando do processo eleitoral, é válido pensar que, no que concerne à educação talvez seja demasiado tarde para ficar esperando que as coisas mudem ou melhorem, visto que os discursos circulantes nas esferas governamentais, proferidos por seus representantes, não enfatizam o ensino superior como prioritário, principalmente, o ensino gratuito e inclusivo. As manifestações de ministros nos levam numa inversão nos investimentos e consequentes prejuízos para a formação dos jovens brasileiros. 

 

Já no MCTIC, o Ministro Marcos Pontes sinalizou positivamente para a comunidade científica falando em lutar por um orçamento que permita às instituições de fomento atender aos pesquisadores e potencializar a pesquisa e a inovação no país, assim como, incentivar aos jovens a se tornarem pesquisadores. Todavia, há que se ponderar que o Ministro não possui base política forte e, portanto, será muito difícil que consiga articular dentro das instâncias governamentais condições melhores para o ministério que ora comanda. Isso significa que a comunidade científica necessita ficar atenta e articulada para entrar em ação sempre que necessário. 

 

 

RUY SARDINHA, EX-PRESIDENTE DA SOCICOM E MEMBRO DO CONSELHO FISCAL

Há pouco menos de um mês da posse do novo governo ainda é prematura qualquer tentativa de análise dos caminhos que a sociedade brasileira seguirá a partir de então. De qualquer forma chama a atenção o fato do “critério técnico”  das escolhas da equipe ministerial ter resultado na presença de apenas nove ministros com experiência anterior em funções da administração pública (destes, boa parte é oriunda do governo de Michel Temer) ou ainda  a forte presença  de militares, 32%, aproximando-se , durante o período da redemocratização, do curto governo de Fernando Collor de Melo (33%). Somadas as origens militar do presidente e seu vice e a presença de outros militares em cargos do governo, temos uma gestão que se aproxima a dos tempos da ditadura. 

 

É óbvio que a conjuntura social e política se alterou, com o fortalecimento das instâncias democráticas, e que, qualquer tese de uma “volta do regime ditatorial” precisa ser vista com cuidado. Não obstante, talvez possamos falar de um período de governança ideológico-militar que embora não hegemônica e por vezes conflitantes com outros segmentos do governo, como, por exemplo, as matrizes neoliberais presentes na gestão da economia, terá importantes consequências nos destinos de nosso país.  Até que ponto tal matriz político-ideológico será capaz de responder aos principais desafios  e conflitos do Brasil atual e proporcionar políticas públicas que levem ao desenvolvimento integral de nossa população é a grande incógnita que esse início de mandato nos traz.

 

 

RUDIMAR BALDISSERA, DIRETOR DE RELAÇÕES NACIONAIS DA SOCICOM

Em seu discurso de posse, ocorrida em dois de janeiro, o ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, afirmou a intenção de tornar o país atraente aos pesquisadores para que permaneçam no país. No entanto, a realidade que vivemos está distante disso. O orçamento para a formação de pesquisadores (como bolsas de mestrado e doutorado) e, particularmente, para a pesquisa tem sofrido reduções gradativas e amplas desde 2015. Essa desidratação orçamentária se traduziu, por exemplo, em não publicação de editais de pesquisa e no atraso na liberação de recursos para o desenvolvimento de projetos aprovados. 

 

A situação é muito grave considerando, dentre outras coisas, a importância estratégica que a ciência e a tecnologia têm para a autonomia do país, e os impactos dessa agressão serão sentidos por longo tempo. Portanto, a reestruturação orçamentária é tema urgente. Nesse cenário, Pontes afirmou, em sua posse, que é preciso agir em diferentes frentes, tais como negociar com o Congresso Nacional para a recomposição do orçamento e implementar de modelos de participação privada para o desenvolvimento da pesquisa. 

 

Até o momento não há informações mais precisas sobre a implementação dessas ações. Se por um lado, a negociação com o Congresso Nacional é fundamental para reconstruir o orçamento, por outro, é preciso muita atenção sobre como se dará a composição com a iniciativa privada para que a ciência não seja reduzida aos interesses de mercado, a formar mão de obra para atender as demandas dessas empresas.

 

 

NELIA DEL BIANCO, VICE-PRESIDENTE DA SOCICOM

A entrevista do ministro da Educação revela o foco de atuação do atual governo, claramente contrário às políticas inclusivas, como a ampliação do ensino superior público para todos e, especialmente, para alunos oriundos de escolas públicas de ensino médio. 

 

A ideia do ministro Vélez Rodrigues de universidade pública somente para uma elite intelectual nos faz regredir aos tempos da ditadura militar quando o acesso era restrito à classe média, seja pelo número de vagas oferecidas e pela ausência de políticas públicas de igualdade de condições para todos. Regride ainda mais em ações que mudaram a face da universidade na última década como o PROUNI,  um exemplo de política pública. O programa priorizou a diversidade cultural e social que há no país e buscou oferecer mais oportunidades às pessoas de baixa renda. Por meio desse programa, os estudantes que não possuem condições financeiras para arcar com os custos das mensalidades do curso escolhido, puderam concorrer a bolsas integrais ou parciais em IES privadas dependendo da nota alcançada pelo mesmo no exame nacional do ensino médio (ENEM). 

 

Esse tipo de visão liberal significa um retrocesso também nas ações de democratização da educação superior e de justiça social que se fixaram enquanto prática hegemônica, mesmo diante dos embates enfrentados com parte da sociedade que recusa esse modelo para defender práticas privatizantes.

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Socicom acompanha com atenção a política de educação, ciência e tecnologia do novo governo

 

No primeiro mês de governo Bolsonaro, mudanças no comando do MEC e agências de fomento, além de declarações dos ministros da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues, e do MCTI, Marcos Pontes, preocupam membros da diretoria da Socicom. 

 

Em entrevista ao Jornal Valor Econômico em 28 de janeiro, o ministro da Educação disse que estuda a ideia de universidade para todos não existe”. Segundo Vélez Rodrigues, não faz sentido um advogado estudar para virar motorista de Uber. Para o ministro o retorno financeiro dos cursos técnicos é maior e mais imediato do que o da graduação. “As universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual, que não é a mesma elite econômica do país”, afirma o ministro. Por hora, o ministro disse que não está em estudo cobrança de mensalidade nas universidades públicas, mas defende o enxugamento do FIES e o reequilíbrio orçamentário, além de maior investimento no ensino médio.

 

Um levantamento realizado pelo UOL em 24 de janeiro mostra que menos seis militares foram nomeados para cargos no MEC. Além deles, outros dois devem ter as indicações oficializadas em breve por meio de publicação no Diário Oficial da União. São membros das Forças Armadas e até mesmo da reserva remunerada e não remunerada do Corpo de Bombeiros e da Marinha, e irão ocupar cargos no MEC, ficando responsáveis pelo comando de ações como o financiamento estudantil, a regulação do ensino superior presencial e a distância e o gerenciamento de hospitais universitários federais. São eles:

 

1. General Francisco Mamede de Brito Filho, ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) foi nomeado para a chefia do gabinete do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).

2. General Oswaldo de Jesus Ferreira, indicado para Presidência da Ebserh, responsável pelo gerenciamento dos hospitais universitários federais de todo o país. 

3. Coronel Robson Santos da Silva, nomeado assessor especial do ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. 

4. Coronel-aviador Ricardo Wagner Roquetti, nomeado diretor de programa da secretaria-executiva do MEC. 

5. Coronel da reserva remunerada do Corpo de Bombeiros, Luiz Tadeu Vilela Blummnomeado diretor de gestão de fundos e benefícios do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica).   

6. Coronel da reserva remunerada do Exército, Sebastião Vitalino da Silva, indicado para a Coordenação-geral de materiais didáticos da SEB (Secretaria de Educação Básica). 

7. Tenente-coronel Marcos Heleno Guerson de Oliveira Junior, indicado para a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior. 

8. Capitão-de-Corveta da reserva remunerada da Marinha, Eduardo Miranda Freire de Melo, nomeado para a secretaria-executiva do MEC, como secretário adjunto.     

 

 

COMO PENSA A DIRETORIA DA SOCICOM?

 

 

ANA REGINA RÊGO, PRESIDENTE DA SOCICOM

Entre experiências e expectativas, nós da SOCICOM nos colocamos como vigilantes do novo projeto de país que aí se instala, sobretudo, no que concerne às áreas que nos envolvem. Embora seja demasiado cedo para tirar conclusões definitivas sobre uma efetiva política para a educação superior, assim como, para a ciência, tecnologia, inovação e comunicação, visto que nenhum plano maior ou estratégia foi divulgada para além das poucas linhas no reduzido Plano de Governo do atual Presidente, quando do processo eleitoral, é válido pensar que, no que concerne à educação talvez seja demasiado tarde para ficar esperando que as coisas mudem ou melhorem, visto que os discursos circulantes nas esferas governamentais, proferidos por seus representantes, não enfatizam o ensino superior como prioritário, principalmente, o ensino gratuito e inclusivo. As manifestações de ministros nos levam numa inversão nos investimentos e consequentes prejuízos para a formação dos jovens brasileiros. 

 

Já no MCTIC, o Ministro Marcos Pontes sinalizou positivamente para a comunidade científica falando em lutar por um orçamento que permita às instituições de fomento atender aos pesquisadores e potencializar a pesquisa e a inovação no país, assim como, incentivar aos jovens a se tornarem pesquisadores. Todavia, há que se ponderar que o Ministro não possui base política forte e, portanto, será muito difícil que consiga articular dentro das instâncias governamentais condições melhores para o ministério que ora comanda. Isso significa que a comunidade científica necessita ficar atenta e articulada para entrar em ação sempre que necessário. 

 

 

RUY SARDINHA, EX-PRESIDENTE DA SOCICOM E MEMBRO DO CONSELHO FISCAL

Há pouco menos de um mês da posse do novo governo ainda é prematura qualquer tentativa de análise dos caminhos que a sociedade brasileira seguirá a partir de então. De qualquer forma chama a atenção o fato do “critério técnico”  das escolhas da equipe ministerial ter resultado na presença de apenas nove ministros com experiência anterior em funções da administração pública (destes, boa parte é oriunda do governo de Michel Temer) ou ainda  a forte presença  de militares, 32%, aproximando-se , durante o período da redemocratização, do curto governo de Fernando Collor de Melo (33%). Somadas as origens militar do presidente e seu vice e a presença de outros militares em cargos do governo, temos uma gestão que se aproxima a dos tempos da ditadura. 

 

É óbvio que a conjuntura social e política se alterou, com o fortalecimento das instâncias democráticas, e que, qualquer tese de uma “volta do regime ditatorial” precisa ser vista com cuidado. Não obstante, talvez possamos falar de um período de governança ideológico-militar que embora não hegemônica e por vezes conflitantes com outros segmentos do governo, como, por exemplo, as matrizes neoliberais presentes na gestão da economia, terá importantes consequências nos destinos de nosso país.  Até que ponto tal matriz político-ideológico será capaz de responder aos principais desafios  e conflitos do Brasil atual e proporcionar políticas públicas que levem ao desenvolvimento integral de nossa população é a grande incógnita que esse início de mandato nos traz.

 

 

RUDIMAR BALDISSERA, DIRETOR DE RELAÇÕES NACIONAIS DA SOCICOM

Em seu discurso de posse, ocorrida em dois de janeiro, o ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, afirmou a intenção de tornar o país atraente aos pesquisadores para que permaneçam no país. No entanto, a realidade que vivemos está distante disso. O orçamento para a formação de pesquisadores (como bolsas de mestrado e doutorado) e, particularmente, para a pesquisa tem sofrido reduções gradativas e amplas desde 2015. Essa desidratação orçamentária se traduziu, por exemplo, em não publicação de editais de pesquisa e no atraso na liberação de recursos para o desenvolvimento de projetos aprovados. 

 

A situação é muito grave considerando, dentre outras coisas, a importância estratégica que a ciência e a tecnologia têm para a autonomia do país, e os impactos dessa agressão serão sentidos por longo tempo. Portanto, a reestruturação orçamentária é tema urgente. Nesse cenário, Pontes afirmou, em sua posse, que é preciso agir em diferentes frentes, tais como negociar com o Congresso Nacional para a recomposição do orçamento e implementar de modelos de participação privada para o desenvolvimento da pesquisa. 

 

Até o momento não há informações mais precisas sobre a implementação dessas ações. Se por um lado, a negociação com o Congresso Nacional é fundamental para reconstruir o orçamento, por outro, é preciso muita atenção sobre como se dará a composição com a iniciativa privada para que a ciência não seja reduzida aos interesses de mercado, a formar mão de obra para atender as demandas dessas empresas.

 

 

NELIA DEL BIANCO, VICE-PRESIDENTE DA SOCICOM

A entrevista do ministro da Educação revela o foco de atuação do atual governo, claramente contrário às políticas inclusivas, como a ampliação do ensino superior público para todos e, especialmente, para alunos oriundos de escolas públicas de ensino médio. 

 

A ideia do ministro Vélez Rodrigues de universidade pública somente para uma elite intelectual nos faz regredir aos tempos da ditadura militar quando o acesso era restrito à classe média, seja pelo número de vagas oferecidas e pela ausência de políticas públicas de igualdade de condições para todos. Regride ainda mais em ações que mudaram a face da universidade na última década como o PROUNI,  um exemplo de política pública. O programa priorizou a diversidade cultural e social que há no país e buscou oferecer mais oportunidades às pessoas de baixa renda. Por meio desse programa, os estudantes que não possuem condições financeiras para arcar com os custos das mensalidades do curso escolhido, puderam concorrer a bolsas integrais ou parciais em IES privadas dependendo da nota alcançada pelo mesmo no exame nacional do ensino médio (ENEM). 

 

Esse tipo de visão liberal significa um retrocesso também nas ações de democratização da educação superior e de justiça social que se fixaram enquanto prática hegemônica, mesmo diante dos embates enfrentados com parte da sociedade que recusa esse modelo para defender práticas privatizantes.